29 junho 2022
Oh! Cruel guerra…!
A SAUDADE 1
A mente que nos eleva
Não importa o quê lembrar
Mas a vida tudo há-de achar
Que ao coração nos afeta
A saudade rege o olhar
Que um momento nos retrata
Seguindo o dom de criar
Nesse foco a delirar
Na mente que se desata
A saudade abre um sorriso
Daquele instante passado
Vagueando de improviso
Nas asas do paraíso
Soltando o choro salgado
A saudade abre os braços
Ao amor que nunca esquece
E deixa marca, deixa laços
Em cada ano por onde passo
Que essa loucura acontece
A saudade tem harmonia
No tom da pele a roçar
Das cores que o tempo fazia
Da chuva, do rio que corria
Das flores no campo a teclar
A saudade tem perfume
Que se entranha no sentido
Tem fogo, tem azedume
Uma paixão um ciúme
Desse sopro tão atrevido
A saudade tem sabor
Do manjar da nossa avó
Tem um quadro, uma estima
Uma canção, uma rima
Um desejo de estar só
Évora, 20-02-2022, Maria Antonieta Matos
ACORDEI COM TEU BEIJO ABENÇOADO
Abracei-te carinhosamente nos meus braços
Senti teu alento no meu colo idolatrado
Que gemia de emoção no nosso laço
A luz do sol resplandecia na janela
Oferecia maior esperança o novo dia
O amor fazia parte da nossa cela
Como um palácio luxuoso cheio magia
Um passarinho a cogitar no parapeito
Entre a vidraça transparente, tão altivo
Espreitava enternecido o nosso leito
Refletindo o seu olhar surpreso e cativo
Évora, 28-01-2022 - Maria Antonieta Matos
Pintura: Costa Araújo
Eu e tu
Talvez no correr dos anos vás esquecer
Os momentos felizes no verde campo, contigoÁ sombra da oliveira, com o sol a derreter
Entre olhares comungava meus ensejos contigo
Talvez os anos sejam o foco da lembrança
Que nós os dois temos sempre em mente
Por serem sorridentes num mar da esperança
Eternizamos nossos instantes para sempre
Talvez ainda velhinhos de mãos dadas
Com olhar provocador e matreiro, aconchegados
No nosso manto em fogo, até à alvorada
Talvez a vida não se esqueça de nós dois
E os anos passem eternamente apaixonados
Sempre ardentes como amantes, mesmo depois
Talvez emaranhados como livros velhos
Abraçados em estantes cobiçadas
Escorregando nas casas como novelos
Em castiçais sem luz, as suas laudas
Talvez o fogo que ateia de boca-em-boca
No ermo verde, apinhado de flores enraizadas
Sopre aos berros como uma cabra louca
A fantasia, a explosão das cinzas, e já não resta nada!
Évora, 14-01-2022 - Maria Antonieta Matos
TÃO LUXUOSA E ATRAENTE
VIVO CATIVA EM TEU CORPO
Meu peito bate incessante
Ansiosa dos teus beijos
Ancorada em desejos
Revoltos d´ abraços ardentes
Vivo a caminhar nos teus passos
Como uma sombra bailando
Esvoaçando nos teus laços
Entre toques meigos que de faço
No teu corpo baloiçando
Vivo… tua companheira eterna
Como o orvalho na flor ao amanhecer
E à noite sempre a luz duma lanterna
No horizonte o perfume numa caverna
Ouvir nossa canção na nudez acontecer
Vivo na dor, no prazer, na tristeza n´alegria
Sempre a considerar a mudança
Uma cura inquieta porém oso sabedoria
No amor… condimentos, euforia
A cada ano, a cada dia, inundada d’ esperança
14-10-2021 Maria Antonieta Matos
Pintura: Costa Araújo
JÁ TANTO OS MEUS OLHOS VIRAM…
O QUE SOU HOJE
O que sou hoje,
nunca saberei amanhãQuando se apagarem as luzes
Na alvorada da nova manhã
Em que o pensar em todos urge
Entrarei no esquecimento
Ou no juízo de cada um
Ou no alívio de alguns
O que sou hoje
Nada tenho para lembrar
Uma obra, uma herança para deixar…
Que solte o prazer do povo
para com júbilo celebrar
Resta-me viver na esperança
Pedir à lua bonança
Ao sol iluminação
Às nuvens sua emoção
À chuva esse alimento
Que agite os ramos e a direção
O que sou hoje, ninguém sabe
Mas deixa-me pensar que há-de,
Chegar o sonho, parecer real
Nascer a obra mesmo já tarde
Maria Antonieta Matos 07-09-2021
PAIRA A RESMUNGAR A CEGARREGA
Paira a resmungar a cegarrega
No meu ouvido… que ensurdece, saturado!
Até me ausento do mundo, por que me cega
O remoinho nos sentidos, penetrado
Preenches o pensamento que me nega
Qualquer ideia que tenha planeado
Sempre o ruído uma peta me prega
Distraindo o plano no tempo adiado
Quando me deito e o espirito sossega
Lá te oiço mais intensa e perversa
E faço um apelo… e por mais que te peça
Surge teu sinal em mim sempre alerta.
Maria Antonieta Matos
Pintura: Costa Araújo
OS MEUS DIAS VÃO MORRENDO
Os meus dias vão morrendo
Na soidade das palavrasQue me faltam… remexendo
Há que tempo confinadas
Onde estão as palavras de ternura?
Que os meus amores me diziam
Às vezes, não com tanta frescura
E que agora me apeteciam
Preciso do toque delas
Revestidas de emoção
Dessa sensação que só elas,
Perto aquecem… meu coração
Estou receosa que se percam
Não tenham o mesmo sabor
Que vão continuar distantes
E aos meus olhos percam a cor
Até quando este vazio
Das palavras sempre em festa
Que acalentavam o frio
Até na casa cheia de frestas
05-03-2021 Maria Antonieta Matos
MINHAS MÃOS
Minhas mãos dormentes, encarquilhadas
Mostram-me o caminho da idade
A murmurar ressaltam pintas desajeitadas
Num jardim em festa ao fim da tarde
Minhas mãos meigas a pintar teu corpo
E a enternecer teu coração
Vão perpetuando esse doce mosto
Como o dedilhar do terço na oração
Minhas mãos falam-te delicadas
Tateando entrelaçadas no amor
Tocando sentimentos à pele arrepiada
Não há idade que impeça o sonho
As minhas mãos têm a cura para dor
Nos afagos que disponho
25-02-2021 Maria Antonieta Matos
Pintura: Costa Araújo
FICA EM CASA
O que fazer neste tempo,
Para contentar este povo?
O que um quer, outro não quer,
Sempre contra ao que há de novo.
Muito lento a perceber,
A cada medida implantada,
Faz ouvidos de mercador,
Sem responsabilidade de nada.
E o vírus vai inflamando,
O corpo de cada um,
Replicando acomodado,
À espreita dos descuidados,
Sem distanciamento nenhum.
Sem máscara descontraídos,
Perfilados na loucura,
Contrariando a evidência,
Que o vírus ateia a fervura,
Que a festa e a negligência,
É bom…! Mas pouco dura.
Fica em casa, resguardado,
Lava as mãos repetidas vezes,
Não ponhas as regras de lado,
Olha a vida o teu passado,
Não percas os dias e meses.
Maria Antonieta Matos 11-02-2021
Pintura:Costa Araújo
OBSERVO INQUIETUDE DESMEDIDA
Um mundo em euforia, que desconheço
Retórica sombria, revoltas a aclamar
Abrindo espaço a um despertar avesso
Guerra súbita, que aos excessos dá valor
Que veda os olhos ao humanismo e à paz
Que engana sem respeito nem amor
Que cinzenta a verdade no engodo assaz
Vejo a lucidez transviada numa agonia
A pobreza que há muito tempo não via
Uma doença que nos consome
Vamos deixar… esse sono profundo
Unir as mãos com resiliência em todo mundo
Conciliar, construir, acabar com a fome
Évora, 26-01-2021 – Maria Antonieta Matos